Encontro em Paraty promoveu o intercâmbio entre as várias iniciativas da Fiocruz que trabalham a relação entre saúde e agroecologia. A Cooperativa EITA esteve presente no Encontro, e foi apresentada como uma das experiências no Seminário Temático sobre Agroecologia e Comunicação.
por André Antunes – EPSJV/Fiocruz
Terminou no último sábado (24) o Encontro de Diálogos e Convergências ‘Saúde e Agroecologia’, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), com a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e com o Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra, Paraty e Ubatuba (FCT). O encontro reuniu, no Quilombo do Campinho, em Paraty-RJ, cerca de 150 participantes, entre trabalhadores da Fiocruz, agricultores, representantes de povos e comunidades tradicionais e de organizações da sociedade civil. O objetivo foi ampliar o intercâmbio entre as várias iniciativas da Fiocruz que trabalham na convergência entre saúde e agroecologia, bem como fortalecer a articulação da instituição com ANA e ABA e outras organizações e movimentos sociais que promovem a agroecologia nos diferentes estados onde a Fiocruz tem atuação.
“Essa é uma agenda estratégica importante para a Fiocruz, definida coletivamente pelos seus trabalhadores. A conjuntura que vivemos no Brasil e no contexto internacional é de retrocessos em conquistas sociais importantes, perdas de direitos. Este ano celebramos 70 anos da Declaração dos Direitos Humanos da ONU, assim como da chamada ‘Revolução Verde’, e o que vemos é um cenário em que mais de 800 milhões de pessoas passam fome no mundo, com o Brasil voltando ao Mapa da Fome. Então a discussão da agroecologia é importantíssima hoje para pensar a questão da fome, da posse da terra, dos sistemas agroalimentares”, afirmou o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Marco Menezes, durante a abertura do encontro.
Projetos de norte a sul do país
Segundo um mapeamento realizado pela VPAAPS/Fiocruz na preparação para o encontro, a agroecologia é atualmente um eixo de atuação importante da Fundação. Dezessete unidades da Fiocruz em quatro regiões do Brasil possuem experiências que trabalham com a agroecologia, que mobilizam centenas de trabalhadores. A parceria com outras instituições tem centralidade para a realização do trabalho da Fiocruz com essa temática: ao todo, são 59 parcerias com instituições externas, entre movimentos sociais como o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e dos Atingidos por Barragens (MAB), entre outros, bem como com universidades e centros de pesquisa, Ministério Público Federal (MPF) e estaduais, ONGs e outros órgãos públicos nas esferas federal, estadual e municipal. Agricultores familiares, quilombolas, indígenas, assentados da reforma agrária, agentes comunitários de saúde, trabalhadores urbanos e estudantes do ensino fundamental, médio e superior estão entre as principais categorias envolvidas nos projetos de agroecologia da Fiocruz pelo Brasil, que trabalham a temática sobre diferentes abordagens. Água e saneamento, agricultura urbana, alimentação, comunicação, educação e formação, plantas medicinais, conflitos territoriais e socioambientais e agrotóxicos estão entre as principais temáticas trabalhadas pelos projetos em agroecologia cadastrados nas diversas unidades da Fiocruz.
Território, saúde e sustentabilidade na Serra da Bocaina
Entre as principais experiências está a do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), que reúne Fiocruz, Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra, Paraty e Ubatuba ( e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A presença do observatório da Serra da Bocaina e sua articulação com movimentos sociais do território como o Fórum, que reúne populações quilombolas, indígenas e caiçaras de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, foi um fator central para a escolha do Quilombo do Campinho para a realização do encontro. “A escolha do território da Bocaina se deu pela importância de ter o território como espaço de produção das atividades que promovem a saúde e, entre elas a agroecologia”, afirmou Edmundo Gallo, coordenador geral do OTSS e pesquisador da Fiocruz. “Queremos que isso reverbere para dentro da Fiocruz com outras experiências que trabalham com uma perspectiva territorializada, de promoção da saúde, de desenvolvimento sustentável como nós fazemos aqui. Dessa forma podemos aprender com o intercâmbio desse encontro e assim aprimorar essa abordagem para dentro da instituição”, ressaltou.
O observatório tem hoje diversas frentes de atuação, como a que trabalha o saneamento ecológico na Praia do Sono em Paraty (que figurou nesta matéria da última edição da Poli). A promoção da transição agroecológica nos territórios é outra frente, com projetos voltados à implementação de sistemas agroflorestais, coleta de sementes florestais, reflorestamento e também de manejo agroecológico da palmeira juçara e de produtos não madeireiros para artesanato. A questão da justiça ambiental e defesa dos territórios tradicionais é outro ponto importante de atuação do observatório, que fornece assessoria jurídica nos casos de conflitos envolvendo as comunidades, bem como articulação com outras instituições como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e também o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública estadual.
Curta Agroecologia: comunicação e agroecologia em destaque
Na comunicação, um destaque da atuação da Fiocruz nessa área apresentada durante o encontro é a série Curta Agroecologia, realizado em parceria entre a Articulação Nacional de Agroecologia, a Vídeo Saúde Distribuidora, vinculada ao Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e o Canal Saúde. Iniciado em 2014, o projeto envolve a produção de documentários em vídeo retratando experiências bem sucedidas em agroecologia e denunciando situações de injustiça ambiental em diversos estados do Brasil. O caso dos trabalhadores rurais da Chapada do Apodi, fronteira de expansão da fruticultura irrigada no Ceará, que desenvolveram cânceres devido ao contato com agrotóxicos, foi tema de um documentário lançado em 2015; outro documentário, de 2016, abordou as feiras e espaços de comercialização organizados por agricultores familiares da região metropolitana do Rio de Janeiro para a comercialização de seus produtos. Todos os documentários da série Curta Agroecologia estão disponíveis para download no site do Canal Saúde.
Agroecologia na EPSJV
Duas experiências realizadas pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) foram apresentadas durante o encontro em Paraty. Uma delas foi a ‘Feira Agroecológica Josué de Castro – Sabores e Saberes’, realizada quinzenalmente no campus da Fiocruz no Rio de Janeiro, organizada pela EPSJV em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz). Realizada desde 2014, a feira busca trazer o debate da transição agroecológica e da soberania alimentar com a comercialização de alimentos livres de agrotóxicos e produzidos pela agricultura familiar.
A experiência do Curso Técnico em Meio Ambiente (CTMA), realizado pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e com a Universidade Federal do Ceará (UFC) foi outra iniciativa apresentada pelo ex-professor-pesquisador da EPSJV/Fiocruz André Búrigo. Concluído em 2013, o curso formou técnicos em meio ambiente em territórios de assentamentos do MST no Paraná e no Ceará. Segundo André, que atualmente é assessor da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) da Fiocruz, o curso buscou fortalecer o debate sobre Saúde do Campo dentro do SUS, e trouxe a agroecologia como um eixo central na composição de seu currículo. O curso foi sistematizado em fascículos que estão disponíveis para download no site da EPSJV/Fiocruz.
Além destas, a EPSJV/Fiocruz tem outras iniciativas que dialogam com a agroecologia, em parceria com movimentos sociais do campo e de luta contra os agrotóxicos. Em 2012, a EPSJV coordenou, junto com o MST, a elaboração do Dicionário da Educação do Campo, com vários verbetes abordando temáticas direta ou indiretamente relacionadas à agroecologia (‘Agroecologia’, ‘Agrotóxicos’, ‘Reforma Agrária’, ‘Agricultura Familiar’, ‘Ambiente’, entre outros). A Escola também publicou, em parceria com a editora Expressão Popular, o ‘Dossiê Abrasco: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde’, publicação que sistematiza estudos de pesquisadores sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Desde março de 2018 a EPSJV, por meio do projeto “EPSJV Sustentável”, compra os produtos destinados à alimentação dos alunos da instituição de agricultores familiares que produzem sem agrotóxicos. 100% da verba destinada para a EPSJV por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é destinada para esse fim, acima do patamar mínimo estabelecido pelo programa, de 30%.
Na comunicação, o Portal EPSJV e a Revista Poli, publicação jornalística bimestral da Escola, trazem pautas sobre temas da agroecologia com frequência. A relação entre saúde e agroecologia foi tema de reportagem da edição mais recente da Poli, de novembro e dezembro de 2018. No Portal EPSJV, parte da produção jornalística sobre agroecologia e a luta contra os agrotóxicos foi reunida no dossiê ‘Saúde sem Agrotóxicos’.
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